A biotecnologia é uma área multidisciplinar que traz diversos benefícios e muitos a conhecem pela aplicação na agricultura. Por exemplo, os transgênicos desenvolvidos para resistência às condições ambientais adversas ou até para se tornarem alimentos mais nutritivos. Como o famoso Golden Rice, arroz modificado geneticamente para produção de β- caroteno – precursor da vitamina A.
Grão de arroz dourado comparado ao grão de arroz branco. Fonte: Wikimedia Commons.
Mas além disso, a manipulação dos organismos em prol da humanidade pode ocorrer de diferentes formas, desde a fabricação de produtos do dia a dia, como sabões e biocombustíveis até na biorremediação após desastres ambientais — como aqueles ocorridos em Mariana (2015) e Brumadinho (2019), assim como o vazamento de petróleo que atingiu mais de dois mil quilômetros do litoral das regiões Nordeste e Sudeste do Brasil em 2019.
Isso é possível porque essa área do conhecimento é extremamente multidisciplinar, chegando a ser dividida em 11 cores! Como a Branca, que se trata do ramo industrial, Cinza que objetiva a conservação e recuperação de ambientes, a Verde que é utilizada no controle de pragas, a Vermelha sendo voltada à promoção da saúde e muitas outras.
Mosquitos transgênicos são uma arma eficaz na luta contra o Aedes aegypti
O Aedes aegypti é o responsável pela transmissão de diversas doenças e a produção dos mosquitos trangênicos é uma peça importante para enfrentar epidemias.
E é na biotecnologia vermelha que encontramos diversas aplicações focadas na promoção da saúde. Hoje em dia está muito difundido que a área é peça chave no desenvolvimento, na produção e no aperfeiçoamento de vacinas, como a da COVID-19. Outra aplicação na área, que também está em evidência, é a produção de mosquitos transgênicos para evitar a transmissão das variadas arboviroses causadas pelo Aedes.
Segundo o Ministério da Saúde, o Brasil registrou 477.209 casos prováveis de dengue em 2021, que apesar da redução de 47,8% comparado com o ano anterior continua um número expressivo.O mosquito Aedes aegypti também é conhecido por transmitir a chikungunya e zika, que deixa sobretudo as gestantes alarmadas devido à associação à microcefalia. Isso enfatiza a importância do controle de criadouros do mosquito e da organização dos serviços de saúde para evitar o aumento expressivo de casos e óbitos.
Assim, a biotecnologia entra de diversas formas, desde insumos estratégicos como larvicidas, inseticidas e até kits diagnósticos. Mas hoje em dia as soluções vão ainda mais longe, através do desenvolvimento de mosquitos transgênicos!
Mosquitos de laboratório
Desde 2002, a empresa britânica Oxitec pesquisa sobre uma solução para combate dos mosquitos através da biotecnologia. Assim, foram incluídos dois genes no Aedes aegypti: um que indica a transgenia através da fluorescência dos microrganismos sob determinada luz e um que impede que os descendentes dos organismos geneticamente modificados (OGM) se tornem adultos. Logo, alguns dias após a eclosão dos ovos, eles morrem, o que impede o ciclo completo do mosquito.
Imagem do Aedes aegypti modificado em laboratório (Foto: Danilo Carvalho e Margareth Capurro).
A partir de 2011, se iniciaram liberações de maneira controlada dos mosquitos no Brasil em municípios da Bahia e posteriormente no interior de São Paulo. Isso foi possível pelo apoio técnico que a empresa deu ao projeto desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) e pela organização Moscamed.
O diretor da Oxitec do Brasil, Glen Slade, afirma que o número de insetos liberados depende da infestação original, sendo considerado um número típico de mosquitos soltos entre 100 e 200 por pessoa, divididos em três liberações. Além disso, a linhagem usada é composta apenas por machos, já que as fêmeas são descartadas. Elas picam e precisam do sangue para produzir os ovos, além de transmitir as doenças. E de acordo com a empresa, a população do mosquito selvagem pode ser reduzida em mais de 90% onde é realizada a introdução do transgênico.
“Os resultados são monitorados por armadilhas de ovos distribuídas por toda a área tratada”, diz Cecilia Kosmann, supervisora de produção e ensaios de campo da empresa. Os ovos encontrados são analisados e eclodidos visando a identificação das porcentagem das larvas dos mosquitos geneticamente modificados.
Em 2021, a empresa divulgou o recebimento de US$ 6,8 milhões (cerca de R$ 38,8 milhões ao câmbio de 06/01/2022) da Wellcome Trust — uma das maiores fundações de caridade do mundo — para avançar na ampliação da tecnologia do Aedes do Bem™ no Brasil. O valor será utilizado para tornar a tecnologia mais acessível às comunidades de baixa renda expostas às doenças causadas pelo mosquito e haverá aplicação de um projeto piloto com duração de dois anos no estado de São Paulo.
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Edição de genoma
O genoma de todos os seres vivos, inclusive o humano, é composto pelo ácido desoxirribonucleico (DNA) que por sua vez é composto pelas bases nitrogenadas adenina (A), timina (T), guanina (G) e citosina (C). Quando essas bases são alteradas, técnica conhecida como edição de genoma, novas proteínas podem ser produzidas para variadas aplicações. O material modificado pode ser inserido em determinado organismo através de um vetor. “A gente modifica essas letras e produz uma nova proteína. Editamos o genoma para que ele possa funcionar de maneira adequada”, diz Rodrigo Ribeiro Resende, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). A técnica está em fase de testes. “Em menos de dez anos, é possível que doenças degenerativas como a do Stephen Hawking, físico inglês que sofre de esclerose lateral amiotrófica, em que a pessoa vai perdendo os movimentos, tenham solução.”
Um caso clássico de impacto positivo em larga escala é o da insulina. Até os anos 1980, quem sofria de diabetes (doença decorrente de defeitos na secreção ou ação da insulina, resultando em episódios prolongados de hiperglicemia) dependia da insulina extraída do pâncreas bovino ou suíno, o que podia provocar reações alérgicas. Graças ao isolamento do gene da insulina humana para produção em bactérias Escherichia coli, as pessoas acometidas com diabetes não dependem mais desse hormônio extraído dos animais, evitando inclusive reações alérgicas. Já no final da década de 90, pesquisadores do Instituto Butantan desenvolveram uma vacina contra o vírus da Hepatite B — conhecido por provocar cirrose e câncer, salvando milhares de vidas.
Diversas doenças podem ser tratadas usando edição de genoma, mas a técnica também pode ser utilizada para desenvolver kits de diagnósticos mais baratos e eficientes. Por exemplo, a linha de pesquisa da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), vencedora de uma modalidade do 7º Prêmio Inovação Medical Services, que une nanotecnologia com metabólitos e micro-RNAS para previsão de um acidente vascular cerebral (AVC).
Uma coisa é certa: a biotecnologia tem potencial para melhorar – e muito – a vida das pessoas. Seja qual for a doença, a cura pode estar a apenas alguns anos de pesquisa, a partir do estudo em laboratório das defesas e propriedades dos organismos.
Fonte: Portal Draft
Oxitec e Biominas Brasil
A Oxitec tem como objetivo ajudar governos e comunidades a manter as populações saudáveis e a aumentar a produtividade de alimentos. E para desenvolver tecnologias inovadoras que podem transformar insetos pragas em ferramentas ambientalmente seguras no Brasil, em 2010 a empresa foi assessorada pela Biominas Brasil para desenvolver seu plano de implementação e estratégia de entrada no país.