Como desburocratizar a integração entre as instituições de pesquisa e as empresas no Brasil para acelerar o processo de inovação? Um pais que está em 13º lugar na produção de ciência e em 70º lugar em inovação requer, com certeza, que se reforce essa relação.
O momento é propício. Podemos aproveitar a experiência fracassada de um modelo exportador de bens primários, inaugurar um novo período com a produção de bens e serviços intensivos em conhecimento, reconfigurando a nossa economia com empresas baseadas em tecnologia endógenas, e romper o longo ciclo de baixo crescimento.
O caminho recente trilhado pela nossa economia, com raros intervalos, reforçou nossa posição de economia periférica e de subordinação às economias centrais. Nos séculos XIX e XX, vivemos os ciclos do ouro, do café e do açúcar para atender ao Velho Mundo. Quase duzentos anos depois de nossa independência, ainda exportamos minério de ferro, soja, carne, óleo cru, suco de laranja e outras comodities para satisfazer, de forma submissa, a um mercado externo, agora expandido pela China.
O Brasil já provou que é capaz de produzir bens de alta tecnologia, como navios, aviões, derivados do petróleo até produtos da química fina e da biotecnologia. Porém algo nos impede de sermos eficientes na construção de um ambiente de cooperação flexível entre a academia e a empresa visando acelerar a transformação da ciência em inovação.
Duas premissas destaco nessa discussão sobre esses entraves. A primeira é um ensinamento do grande pensador brasileiro, Celso Furtado, para quem, por exemplo, o subdesenvolvimento não é uma etapa que precede o desenvolvimento, e sim uma situação em si, da qual só sairemos com políticas próprias e intensa criatividade técnica. A segunda premissa vem do saudoso Darcy Ribeiro. Segundo ele, devemos reunir nossas melhores condições para conduzir um projeto nacional apoiando-nos no desenvolvimento endógeno de saberes e técnicas e não como meros consumidores dessa nova civilização tecnológica. Ainda em sua obra reeditada, O Brasil como problema (2015), Darcy afirma que as forças motoras dessa nova civilização devem se libertar do que chamou de “peias burocráticas” que lhe tolhem o caminho.
Por outro lado, Francis Fukuyama, em seu livro seminal, Confiança (1996), considera-nos uma sociedade de baixa confiança, portanto difícil de nos associarmos com objetivos, padrões e valores compartilhados, como ocorre em outros países. Segundo ele, em países como o nosso, é difícil acontecer associações espontâneas fora da família. Em pesquisa, publicada no Scientific American Journal, Paul Zak (2008) demonstrou que o Brasil se encontra em ultimo lugar em confiança entre os mais de sessenta países pesquisados. Ora, confiança é a base para a cooperação e a integração de esforços.
A tese desses autores é que o progresso de um país e sua capacidade de competir estão ligados a essa característica cultural fundamental: confiança. Como consequência, nas sociedades de baixa confiança,resta os empreendimentos empresariais se originarem nas famílias, ou, quando não, a partir de intervenção e fomento do Estado.
Um outro aspecto a destacar, decorre dessa reconhecida baixa confiança da sociedade brasileira. Para compensá-la, estimula-se a proliferação de normas regulando, controlando e elevando o grau de burocratização das ações governamentais que visem agregar grupos e segmentos em torno de objetivos comuns. Tratam-se, em geral, de instrumentos coercitivos, burocráticos e, muitas vezes, falhos. Apenas como exemplo, de 2000 a 2014, foram criadas 77 mil novas leis no Brasil, 25% dessas inconstitucionais.
Tudo isso demonstra o quanto é difícil construir um ambiente para uma politica de inovação flexível e desburocratizada, que integre a academia, governo e empresa, como se requer no Brasil. Uma política de inovação que produza frutos através do estímulo à confiança entre os segmentos envolvidos. E que evite potencializar, mais ainda, nossa baixa confiança com excesso de burocracia que frustra a alavanca da nova economia que nascerá da integração criativa das instituições de pesquisa e as empresa no Pais.
Por Fernando Peregrino
D.Sc, Diretor de Orçamento e Controle da COPPE, Vice Presidente do CONFIES – Conselho Nacional das Fundaçoes de Apoio às Instituiçoes de Ensino Superior
Fonte: Jornal do Brasil