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Qual é o papel da nutrição de precisão na prevenção e promoção da saúde?

A nutrição de precisão considera fatores individuais, como genética e microbioma, para oferecer soluções personalizadas de prevenção.

 

Nos últimos anos, a nutrição vem passando por uma transformação profunda, impulsionada pelos avanços científicos, pelas mudanças nos estilos de vida e pelos impactos da pandemia. Nesse cenário, ganha força a nutrição de precisão — uma abordagem inovadora que combina genética, microbioma intestinal e hábitos alimentares para oferecer soluções personalizadas, focadas na prevenção de doenças e na promoção da saúde e da longevidade.

A obesidade, por exemplo, tem sido um dos muitos desafios de saúde pública em que a nutrição de precisão mostra seu potencial. No Brasil, cerca de 31% da população vive com obesidade, e entre 40% e 50% dos adultos são sedentários — dados que reforçam a urgência por estratégias mais eficazes e individualizadas.

A Biominas está atenta a essas mudanças e acompanha de perto as tendências que estão reformulando nossa relação com os alimentos, promovendo uma nova era em que saúde, bem-estar e inovação caminham juntos. O foco deixa de ser o tratamento da doença e passa a ser a prevenção.

Por isso, produziu uma série especial que conta com um infográfico, um videocast e um artigo sobre o tema nutrição de precisão. Neste artigo, você confere:

  • O que é nutrição de precisão?
  • Quais são os métodos usados pela nutrição de precisão?
  • Tecnologias digitais que apoiam a NP 
  • Qual é a ligação da nutrição de precisão e a genética?
  • No caminho da prevenção
  • Nutrição de precisão na prática
  • Desafios e oportunidades

Vamos lá!

O que é nutrição de precisão?

A nutrição de precisão é um campo emergente da ciência que busca personalizar a alimentação com base em características únicas de cada indivíduo — como genética, microbioma intestinal, metabolismo, estilo de vida e ambiente. Embora esse campo exista academicamente há pelo menos quatro décadas, foi apenas nos últimos dez anos que ganhou força comercial — impulsionado pelo crescente interesse de investidores e pela popularização de dispositivos de teste direto ao consumidor.

Diferente da nutrição tradicional que baseia-se em médias populacionais, com recomendações genéricas voltadas para grupos, como faixas etárias ou sexo. A nutrição de precisão considera a individualidade biológica, levando em conta fatores como genética, metabolismo e microbioma. 

A partir disso, formula recomendações personalizadas, identificando como cada pessoa responde a nutrientes, o que possibilita uma prevenção mais eficaz de doenças e melhor adesão às dietas.

Quais são os métodos usados pela Nutrição de Precisão?

Fonte: Estudo “A Evolução da Nutrição Personalizada: Definições de nutrição personalizada”

Nos últimos anos, os serviços de nutrição de precisão vêm oferecendo análises cada vez mais personalizadas, baseadas no perfil genético e fenotípico de cada indivíduo. Esses serviços aplicam técnicas originadas da pesquisa biomédica a amostras biológicas coletadas dos clientes, como saliva, sangue, fezes ou urina. Em geral, utilizam seis principais métodos científicos para personalizar suas recomendações nutricionais:

1. Nutrigenética 

A nutrigenética analisa o DNA do indivíduo para identificar variações genéticas que podem influenciar como o corpo responde a diferentes tipos de dieta. Os dados genéticos são geralmente obtidos a partir de kits simples de coleta (como cotonetes bucais) e usados para prever, por exemplo, se uma pessoa tende a ganhar ou perder peso com uma dieta rica em gordura, vegetariana ou mediterrânea. Essa abordagem utiliza “painéis de genes” – um conjunto selecionado de genes associados a processos metabólicos, desempenho físico, ou saúde cardiovascular. 

2. Nutrigenômica

Enquanto a nutrigenética foca em variações na sequência do DNA, a nutrigenômica analisa a expressão dos genes – ou seja, quais genes estão ativos em determinado momento, antes e depois de mudanças na alimentação. Essa área, também chamada de transcriptômica, ajuda a entender como a dieta afeta a atividade celular. Embora mais complexa, essa análise pode ser combinada com medições de biomarcadores no sangue, como colesterol ou glicose, para obter uma visão mais ampla do impacto da alimentação.

3. Metabolômica

A metabolômica estuda os produtos do metabolismo corporal — pequenas moléculas como hormônios, aminoácidos e lipídios — para identificar padrões que possam indicar doenças ou respostas individuais a dietas. Essa análise permite criar “assinaturas metabólicas” associadas, por exemplo, à obesidade ou ao risco cardiovascular. Os dados são obtidos por técnicas sofisticadas, como cromatografia e espectrometria de massas, e dependem da coleta precisa de amostras (saliva, urina, suor, etc.). Devido à complexidade técnica, poucos provedores oferecem esse tipo de análise com profundidade.

4. Microbiômica

O microbioma investiga os microrganismos que vivem no nosso corpo, especialmente no intestino, e sua influência na saúde. A microbiota intestinal afeta não só a digestão, mas também a imunidade, o metabolismo, o humor e o risco de doenças. A análise do microbioma é feita por meio da detecção de sequências de DNA específicas de cada espécie microbiana. Essa técnica, chamada metagenômica, revela a diversidade e o equilíbrio dos microrganismos presentes, o que pode orientar mudanças na dieta para restaurar ou manter a saúde intestinal.

5. Epigenética

A epigenética estuda alterações que afetam a atividade dos genes sem mudar a sequência do DNA. Essas modificações podem ser causadas por fatores como dieta, exposição a toxinas ou estilo de vida, e podem ser transmitidas por várias gerações. A análise epigenética ainda é pouco comum nos serviços comerciais de Nutrição de Precisão, devido à sua complexidade e à necessidade de dados populacionais mais amplos. No entanto, há crescente interesse nesse campo, já que ele pode explicar, por exemplo, padrões hereditários de obesidade mesmo sem mutações genéticas.

6. Análise do Exposoma

O exposoma representa o conjunto de fatores ambientais e comportamentais que influenciam a saúde ao longo da vida — como dieta, sono, estresse e atividade física. Esses dados são hoje amplamente coletados por dispositivos eletrônicos (smartwatches, apps de saúde, etc.), substituindo métodos tradicionais como entrevistas e questionários. Essa abordagem fornece informações essenciais para personalizar recomendações nutricionais e de estilo de vida. Há também um esforço crescente para integrar esses dados com medições moleculares, aumentando a precisão das intervenções.

Extra – Foodômica

Além disso, temos o “foodômica”, termo proposto para descrever a integração de todas as tecnologias “ômicas” aplicadas ao estudo dos efeitos da alimentação no metabolismo humano. Apesar de ser conceitualmente útil, o termo ainda não é amplamente adotado pela comunidade científica.

Tecnologias digitais que apoiam a NP

Como vimos, os serviços de nutrição personalizada comercial geralmente oferecem, como principal produto, o aconselhamento nutricional baseado em evidências científicas atualizadas, que destacam as conexões causais entre determinadas características fenotípicas individuais e as respostas fisiológicas aos alimentos. Porém, além do aconselhamento, os provedores têm expandido suas ofertas, incluindo suplementos e vitaminas, bem como planos alimentares sob demanda, adaptados às necessidades específicas de cada cliente. 

Para além disso, uma variedade crescente de tecnologias digitais está viabilizando e potencializando os métodos científicos utilizados na nutrição de precisão, permitindo a integração de múltiplas fontes de dados para oferecer recomendações nutricionais mais acuradas. Assim, esses sistemas também estão buscando incluir mecanismos de suporte contínuo para acompanhar o progresso do indivíduo e promover mudanças sustentáveis no comportamento alimentar. 

Essa etapa comportamental é considerada uma das mais desafiadoras e decisivas para o sucesso da intervenção. Para isso, estão sendo desenvolvidas diversas soluções digitais, como assistentes virtuais de compras, cozinhas inteligentes e impressão 3D de alimentos sob demanda. Essas inovações têm como objetivo facilitar a adoção de hábitos mais saudáveis, tornando o plano alimentar mais acessível, prático e adaptado à realidade de cada pessoa.

Qual é a ligação da nutrição de precisão e a genética?

A genética explica como o corpo metaboliza nutrientes e reage a compostos e foi só a partir do Projeto Genoma Humano que a nutrição de precisão foi possível.

O Projeto Genoma Humano (HGP) foi uma iniciativa internacional que envolveu mais de 2.800 pesquisadores e um investimento de aproximadamente 3 bilhões de dólares. O primeiro rascunho foi publicado em junho de 2000, e a versão final, em outubro de 2003. O projeto sequenciou cerca de 3 bilhões de pares de bases do DNA humano, mapeando mais de 20 mil genes.

Os dados mostraram que 99,9% do genoma humano é idêntico entre os indivíduos. No entanto, é justamente os 0,1% do DNA que geram as variações gênicas. De acordo com Rafaela Pereira, Analista Científica da Biominas, essas variações são geralmente atribuídas a um único par de bases de um nucleotídeo, conhecidos como SNPs, do inglês Single Nucleotide Polymorphism. “Podemos caracterizar polimorfismos genéticos como a presença de dois ou mais alelos em um locus gênico”.

Os SNPs estão normalmente ligados à diversidade populacional, sendo que mais de 11 milhões deles já foram identificados. “Grande parte dos polimorfismos apresentam baixo impacto na saúde dos indivíduos. Entretanto, é importante ressaltar que os SNPs podem conferir susceptibilidade a doenças e resposta específicas a medicamentos e a e alimentação”, informa.

Essas descobertas impulsionaram o avanço de tecnologias como o Sequenciamento de Nova Geração (NGS), que diminuíram o tempo e o custo das análises genéticas, possibilitando sua utilização prática na clínica médica, terapias gênicas e desenvolvimento de medicamentos personalizados.

Saiba mais sobre como foi feito o sequenciamento genético!

Nutrição de precisão e a prevenção

A nutrição de precisão abre novos caminhos para a identificação de riscos genéticos, como a predisposição ao câncer. Atualmente, como já mencionamos, já é possível calcular scores de risco com base em variações genéticas e, a partir disso, adotar medidas preventivas mais eficazes — com maior adesão dos pacientes. Contudo, esses genes, embora relevantes, não são determinantes, como ocorre em doenças genéticas raras, mas podem servir como indicativo para ações de prevenção.

Neste sentido, o crescimento do setor não está sendo impulsionado apenas pelo crescente interesse dos consumidores em saúde e bem-estar, mas também pelas preocupações dos sistemas de saúde pública. Em escala global, observa-se um aumento alarmante na incidência de doenças crônicas não transmissíveis (DNTs), como diabetes tipo 2, doenças cardiovasculares, câncer, doenças pulmonares crônicas e autoimunes — muitas delas associadas à obesidade. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), as DNTs já respondem por mais de 70% das mortes no mundo, gerando impactos socioeconômicos significativos (OMS, 2021).

A alimentação desempenha papel causal em muitas dessas condições, e os formuladores de políticas públicas veem na Nutrição de Precisão uma possível aliada no enfrentamento dessas doenças. Uma vez que abordagens sob medida são particularmente promissoras. Estudos anteriores mostram, inclusive, que recomendações nutricionais genéricas têm impacto limitado na mudança de comportamento alimentar em larga escala. Além disso, as DNTs estão fortemente associadas à pobreza e à baixa renda, tornando essa questão também um desafio de política social.

Nutrição de Precisão na prática 

Nesse contexto, o projeto europeu Food4Me, financiado pela União Europeia, reuniu 25 parceiros de 12 países para realizar o maior ensaio clínico online sobre nutrição de precisão. O estudo investigou desde os fundamentos científicos até aspectos comportamentais e sociais do consumo alimentar individualizado. Um dos principais achados foi que o aconselhamento nutricional personalizado — mesmo sem incluir dados genômicos ou microbiológicos — foi mais eficaz para promover mudanças positivas na dieta dos participantes, especialmente entre os que apresentavam os hábitos alimentares mais inadequados. Isso reforça o potencial da NP como ferramenta de saúde pública, especialmente quando aliada a processos de decisão compartilhada entre profissionais e pacientes.

Diante desses resultados, países europeus vêm apoiando a pesquisa e o desenvolvimento no setor com diferentes formas de financiamento. Sem uma regulamentação específica, o setor também tem atraído startups e grandes empresas, especialmente nos EUA e na Europa, onde esta última representou 27% do crescimento do mercado de NP em 2019 (ResearchAndMarkets, 2020). Empresas de alimentos, nutrição, biotecnologia e análise de dados vêm entrando no setor, seja diretamente ou por meio de parcerias. Essas empresas atuam como facilitadoras entre consumidores, laboratórios de análises (sangue, DNA, microbioma), nutricionistas e plataformas digitais com base científica, oferecendo desde diagnósticos até suplementos e alimentos sob medida.

No Brasil, iniciativas semelhantes estão surgindo no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) com foco na prevenção de câncer e de doenças cardiovasculares, reconhecendo que prevenir é mais econômico do que tratar. Uma pesquisa coordenada pelo Instituto Nacional de Cardiologia (INC) –  referência no tratamento de alta complexidade em doenças cardíacas do Ministério da Saúde -, por exemplo, irá investigar as causas das doenças cardiovasculares hereditárias na população brasileira. O objetivo é orientar familiares e médicos sobre como conduzir os melhores tratamentos e medidas de prevenção, de acordo com cada caso.

A iniciativa integra o programa Genomas Brasil, lançado em outubro de 2020, que busca aperfeiçoar o entendimento das variações genéticas típicas da população brasileira, o que permitirá, futuramente, o acesso a tratamentos personalizados no SUS. Saiba mais aqui!

Além do gerenciamento de doenças crônicas, a nutrição de precisão também é útil em condições que exigem considerações dietéticas específicas. Segundo Rafaela Pereira, a fenilcetonúria  é um exemplo. Também conhecida como PKU, essa condição é um erro inato do metabolismo que causa o acúmulo de fenilalanina no organismo, devido a uma deficiência na enzima que a metaboliza. Assim, uma dieta restritiva e de suplementação são as únicas maneiras de evitar complicações graves. “Esse caso representa um exemplo fundamental de como as informações pessoais sobre um indivíduo (neste caso, a genética) podem moldar as necessidades dietéticas”, ressalta.

Oportunidades e desafios

Algumas tendências globais se mostram como uma oportunidade para o mercado de nutrição de precisão. O mercado global de nutrigenômica, por exemplo, foi avaliado em US$ 252,2 milhões em 2017 e deve crescer 16,48% ao ano até 2025, impulsionado pela maior conscientização sobre saúde e aumento da obesidade. Já os testes epigenéticos – analisam como fatores externos, como estilo de vida e ambiente, influenciam a expressão dos genes, sem alterar a sequência do DNA –  ainda são caros e pouco consolidados, mas há expectativa de que se tornem mais acessíveis, como ocorreu com a genômica. 

Quando se trata de investimento, a União Europeia e os EUA oferecem subsídios milionários para pesquisas em microbioma e saúde mental, fortalecendo o desenvolvimento da nutrição de precisão. Já no Brasil, o CNPq tem incentivado a pesquisa em saúde de precisão por meio de editais específicos. 

Em 2023, por exemplo, lançou a Chamada nº 16/2023 – Saúde de Precisão, que abrangia pesquisas aplicadas à saúde de precisão, incluindo o desenvolvimento de ferramentas de bioinformática. Em 2024, o CNPq publicou a Chamada nº 33/2024 – Genômica e Saúde Pública de Precisão, ampliando o apoio em áreas como tecnologias em saúde pública de precisão e capacitação de instituições.

Apesar do potencial transformador da nutrição de precisão, sua adoção em larga escala ainda enfrenta desafios significativos. A falta de profissionais de nutrição especializados em áreas como genética e bioinformática e a aplicação de dados de forma prática no cuidado com os pacientes ainda são grandes desafios.  

O acesso aos exames genéticos também é uma barreira. Acontece que, embora os custos venham caindo gradualmente e iniciativas públicas e privadas tenham se mobilizado, eles ainda estão restritos há um público específico e há ainda a necessidade de tornar esses exames mais acessíveis.

A Biominas reafirma seu compromisso em fomentar o debate sobre prevenção e incentivar o desenvolvimento de soluções inovadoras para essa área. Para saber mais clique aqui e baixe o infográfico exclusivo produzido pela Biominas sobre o tema!

Aproveite e veja o videocast Biominas Podcast episódio ‘Nutrição de Precisão: Ciência e Tecnologia Revolucionando a Saúde!” com Annete Marum, Coordenadora da pós-graduação em Nutrição e Medicina de Precisão do IMNP, Bruna Vidal Dias, Nutricionista especializada em Nutrição de Precisão, e mediação de Rafaela Pereira, Analista Científica da Biominas. 

 

Texto produzido por Tuany Alves, Jornalista da Biominas Brasil e revisado por Rafaela Pereira,  Analista Científica da Biominas Brasil. 

 

*Com informações do estudo “A Evolução da Nutrição Personalizada: Definições de nutrição personalizada

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